Trupe Periferia
Antes que seja tarde,
mais uma vez
Hoje (25/06/2020) seria dia de estreia de “Meninos da Rua XV”, o novo espetáculo da Trupe Periferia (os ensaios iriam começar em março). Aprovado pelo fundo municipal de cultura, traz no elenco jovens de diversas comunidades de Curitiba, Araucária, Mandirituba e Ponta Grossa. 12 atores, entre eles meninos em situação de acolhimento, que moram em casas lares junto a dezenas de outros jovens, muitos deles adolescentes que estavam em situação de rua, que em grande parte vivem pelo calçadão da capital paranaense.
Um espetáculo de sonho e fantasia, com choque de realidade. Um convite à vida. A sociedade julga a criança e o jovem em situação de rua, em situação de acolhimento. São tratados como marginais, abandonados, sem família, drogados, vagabundos. A peça não vai mostrar a violência na rua, o descaso dos olhares. Vai, de forma artística e poética, encenar que toda alma é viva, pertence, sente saudades e sonha.
Temos urgência. Curitiba amanheceu os primeiros dias de 2020 com a triste notícia de uma vida ceifada, aos 18 anos – não noticiada e tão pouco sabida por muitos. Uma das histórias que o espetáculo queria ter mudado. Esperamos estar em cena logo. Esperamos trocar olhares com o público, com a sociedade. Esperamos ser mudança. Somos esperança.
Para Mika MC, 15 anos: “O espetáculo pra mim é sonho, é motivação, pra outros é realidade, é pesado. Não poder estrear o espetáculo me traz um vazio no peito, por ter algo tão grande guardado e não poder mostrar, queria que sentissem… Mas, creio que tudo tem seu tempo.
A Poeta Diva Ganjah expressa o orgulho que a comunidade sente quando se vê representada na arte por um dos seus moradores. “Ser integrante da Trupe Periferia é estar vivo, literalmente falando. Ver a burguesia impactada elogiando nosso trabalho e até duvidando que somos periféricos, é tipo caramba, olha onde minha voz chegou”.
A dramaturgia entrelaça narrativas e poesia marginal dos poetas-atores-criadores. Nos versos do Poeta Zago, 18 anos:
É só mais uma criança que o Papai Noel esqueceu
que o coelhinho não passô,
que a mãe abandonô,
que o mundo criô.
Hoje está na rua passando fome e frio
vê criança sorrindo e brincando
pra ele isso nunca existiu
é só mais um que enriquece a estatística brasileira
Os que foram abandonados e isso não é brincadeira
Sofre tanto com abandono infantil
Hoje é só mais um morador das tantas ruas do Brasil
O cenário é ilustrado pelo artista grafiteiro Gustas. O figurino traz referências de Efigênia Rolim e é assinado por Gui Almeida. A iluminação é criação de Wagner Corrêa.
Em homenagem ao Menino E.
Atores-poetas-criadores: Serginho Smith, Poeta Zago, Mika MC, Naju MC, Mary Jane MC, Handal, Poeta Diva Ganjah, Elton Louis, Vitor Binni, Felipe o Poeta, Adriano Bim, Menino F.
Siga a Trupe Periferia no Instagram (@trupeperiferia). No início da pandemia, os jovens lançaram Poesia pra sua 40tena, uma série de video-poemas.
A Trupe Periferia nasceu em julho de 2019, com o espetáculo A bala alojada na arte, na Mostra Emergente, no Teatro Novelas Curitibanas – Claudete Pereira Jorge.
Adendo
Ressaltamos para luta para todos. 23 de julho é Dia Nacional de Enfrentamento à Situação de Rua de Crianças e Adolescentes, com a ação CRIANÇA NÃO É DE RUA. Por que desse dia? Lembra da chacina da candelária? Pois é. No ano de 1993, policiais abriram fogo contra cerca de 70 crianças e adolescentes que dormiam no entorno da igreja. Desse número, seis meninos maiores de idades e dois menores de 18 anos foram barbaramente assassinados.
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Arte parada no ar
Manifesto
Arte parada no ar
O perigo vem pelo ar
O simples respirar é um risco
Estamos em suspenso
Atônitos
Parados
Se antes ofegantes
pelos tempos sombrios da política,
agora interrompemos a inspiração
Nosso ofício
marcado pelo encontro de pessoas
parou
Artistas isolados
Os primeiros a parar
Sem saber quando poderemos voltar
Nossos palcos cobertos de poeira
Refletores no escuro
Exposições com quadros no chão
Músicos sem plateia
Picadeiros sem graça
Sapatilhas guardadas
Livros inéditos
Câmeras desligadas
Registramos nosso momento em imagens e textos.
Criamos, sim, dentro dos limites deste novo normal
que ainda não imaginamos
nem nas distopias mais futuristas
Um rascunho
Um ensaio aberto
Um improviso
Um respiro
mediado por telas digitais
e máscaras
Arte parada no Ar
Um retrato
e um desabafo
de criadores que resistem
Arte parada no ar é um manifesto em construção.
Nossa inspiração vem do texto “Um grito parado no ar”, de Gianfrancesco Guarnieri. A peça estreou em 1973 em Curitiba, com direção de Fernando Peixoto. A obra driblou a vigilância da ditadura de então ao usar de uma linguagem metafórica para discutir os problemas sociais. O drama fala sobre as dificuldades de se fazer arte em um tempo de repressão.